sábado, 10 de setembro de 2011

Por que ler os clássicos

Nesse décimo dia do meme dos trinta livros, o desafio é escolher o clássico favorito.
E vou citar o Italo Calvino (amo!), na obra "Por que ler os clássicos", uma deliciosa coletânea de ensaios, críticas, prefácios e resenhas.

O primeiro texto, da edição brasileira de 2002, da Cia das Letras, propõe, antes de listar os motivos para ler os clássicos, uma (várias) definição do que seriam "os clássicos".

1 - Classicos são aqueles livros dos quais, em geral, se ouve dizer: "Estou relendo..." e nunca "Estou lendo"

2 - Dizem-se clássicos aqueles livros que constituem uma riqueza para quem os tenha lido e amado; mas constituem uma riqueza não menor para quem se reserva a sorte de lê-los pela primeira vez nas melhores condições para apreciá-los.

3 -  Os clássicos são livros que exercem uma influência particular quando se impõe como inesquecíveis e também quando se ocultam nas dobras da memória, mimetizando-se como inconsciente coletivo ou individual.


4 - Toda releitura de um clássico é uma leitura de descoberta como a primeira.

5 - Toda primeira leitura de um clássico é na realidade uma releitura.

6 - Um clássico é um livro que nunca terminou de dizer o que tinha para dizer.

7 - Os clássicos são aqueles livros que chegam até nós trazendo consigo as marcas das leituras que precederam a nossa e atrás de si os traços que deixaram na cultura ou nas culturas que atravessaram (ou mais simplesmente na linguagem ou nos costumes)

8 - Um clássico é uma obra que provoca incessantemente uma nuvem de discursos críticos sobre si, mas continuamente as repele para longe.

9 - Os clássicos são livros que, por mais que pensamos conhecer por ouvir dizer, quando são lidos de fato mais se revelam novos, inesperados, inéditos.

10 - Chama-se clássico um livro que se configura como equivalente do universo, à semelhança dos antigos talismãs.

11 -  O "seu" clássico é aquele que não pode ser-lhe indiferente e que serve para definir a você próprio em relação e talvez em contraste com ele

12 - Um clássico é um livro que vem antes de outros clássicos; mas quem leu antes os outros e depois lê aquele, reconhece logo o seu lugar na genealogia.

13 - É clássico aquilo que tende a relegar as atualidades à posição de barulho de fundo, mas ao mesmo tempo não pode prescindir desse barulho de fundo.
14. É clássico aquilo que persiste como rumor mesmo onde predomina a atualidade mais incompatível.


Os clássicos servem para entender quem somos....


Meus clássicos favoritos, porque, neste aqui, #EpicFail...

1 - Orgulho e Preconceito 

Não é o primeiro livro publicado da Jane Austen, mas foi um dos primeiros a ser escrito, com o título inicial de "First Impressions". Acho bem mais adequado que o "Orgulho" do Darcy (ele não é orgulhoso) e o "Preconceito" da Lizzy. Diante do sucesso de "Razão e Sensibilidade", os editores mudaram o título para outro.
Entre os livros da autora, é o que mais foi feliz ao utilizar a ironia para descrever a sociedade inglesa do começo do século XIX. Mas, tirando o aspecto literário e histórico, me encanta, até hoje, anos depois da primeira leitura, o romance entre Lizzy e Darcy, a mesquinharia da Sra. Bennet, a pateteza do Senhor Bennet, o rídiculo Senhor Collins. Me entristece pensar em Charlote, e ao mesmo tempo que me divirto, me irrito com a piriguetice da Lydia, a irmã caçula... (em um grupo de leitura do qual comecei a participar, lemos outro dia Orgulho e Preconceito, e ficamos fazendo a transposição do grupo para os dias atuais, no Brasil. Bath seria Porto Seguro, com muita paquera, pegação, azaração. rs)
Ainda é atualizado, Bridget Jones mesmo, o diário, é uma obra livremente inspirada, e até o nome do galã é Darcy... 
Entre os homens de Austen, meu favorito é o Frederic de Persuasão. Mas Mr. Darcy sempre tem o seu encanto!

2 - O Mercador de Veneza 

Shakespeare é um gênio. Como disse o Calvino, os clássicos vão influenciar a própria cultura, formar a própria linguagem. A língua inglesa se consolidou depois do Bardo. Adoro Hamlet, me divirto com A Megera Domada, amo A Tempestade, me entristeço com Otelo.
Mas o Mercador é fantástico!
Especialmente o papel do advogado... 
Brilhante uso do Direito! 
Todo estudante de Direito deveria ler, todo jurista deveria reler.
(Não vou comentar sobre o evidente anti-semitismo do texto, não é o momento. Mas, mantendo a leitura crítica, é bem possível transpor para uma leitura de excelente qualidade!)

3 - O cortiço

Aluizio Azevedo descreve cruamente a vida em um cortiço, um local onde a classe mais pobre da época vivia, se alegrava, sofria e morria. 
É triste, é preconceituoso, usava idéias lombrosianas para justificar o comportamento das pessoas. 
Odeio João Romão. Sofro com Bertoleza. 
Me lembrei dele aqui, para o post. Vai voltar para pilha da mesa de cabeceira.

4 - A Ilíada e A Odisséia

Já era encantada com a mitologia e a história grega desde criança, com a Emília e os Doze Trabalhos de Hércules. 
Quando li Homero, foi como se reencontrasse amigos queridos. Eles já viviam, dentro de mim. 


5 -  Cândido  ou o otimismo

Gente, é incrivel a história de Cândido. 
Uma Pollyanna iluminista, com um senso crítico e um humor fascinantes, poderia resumir, toscamente.
Hilário e instrutivo.
"Devemos cultivar nosso jardim"...

6 - A hora da estrela

Conheci Clarice Lispector com esse livro.
Macabéa, triste figura, Macabéa.
Incompetente para a vida.
As vezes, somos todos meio "Macabéa"....

7 - O Evangelho segundo Jesus Cristo

Depois de anos de crise com o catolicismo, o Jesus de Saramago conseguiu me levar, efemeramente, de volta para os braços da Igreja - foi provisório e não durou. A figura humana retratada no romance é tão maior que qualquer figura que qualquer religião retrate... É mais próxima, mais real, mais verdadeira, na ficção, do que nos textos religiosos. Poderia fundar uma religião sobre ela? Jamais. E aí está o ponto principal...

Bem, já voram sete, sete é um número cabalístico, nasci no mês sete, são sete os pecados capitais.
E estes são os meus clássicos capitais!

Também participam do desafio 
O Palco e o Mundo

Um comentário:

  1. Tim-tim! Com exceção da Ilíada, que só conheço parcialmente, e Cândido, li todos os "seus" clássicos. E, como bem lembrou a Mari no post dela, clássicos são os eleitos de quem tem o poder de ditar as normas, ne (ela usou outras palavras, but that's the idea). Todo amor desse mundo por Jane Austen.

    Beijucas

    Rita

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