quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Revolução em mim - sobre os livros da minha infância


Eu adoro ler. Acho que tenho muita sorte por ter sido criada em contato com a leitura, com os livros, com o fantástico mundo da ficção, e ter tido a oportunidade de desenvolver esse hábito, que não é um hábito, é um vício mesmo. Um vício virtuoso, se é que isso existe...

Adoro ganhar livros. Quer me agradar, me dê um livro. Vou ler, com certeza. Posso até não gostar, mas vou ler até o final.
Talvez por consequência, adoro presentear livros. Nem sempre é possível, se eu conheço bem a pessoa e sei que ela não tem o hábito, ou é daquelas que não gosta de nada fora do lugar na casa imaculada, onde não pode haver nada juntando pó além dos enfeites de vidro na sala, nem tento.

Mas conheço poucas pessoas assim, então, em geral, dou livros de presente; especialmente para crianças e jovens.
Para Ana Laura, minha afilhada do coração, dei “Menina Bonita do Laço de Fita”. Ela adora, levou para a escola, me pedia para ler para ela direto, e até decorou a história antes de aprender a ler.


E no aniversário de 14 anos da Lorena, filha linda de uma grande amiga, dei um livro desses moderninhos, que sei que ela gosta, com a capa cheia de glitter e muito pink, mas comprei também “A marca de uma lágrima”, do Pedro Bandeira.


Pensando outro dia sobre como a gente se torna o que é, todo o processo de influências externas e reflexões internas, pensei em todos os livros da minha infância e adolescência, que foram marcantes e me ajudaram a se quem sou.

É uma lista bem imensa, se fosse colccar todos mesmo, mas vou colocar só alguns favoritos.

Primeiro: Frances Hodgson Burnett. Não ,não é o Pequeno Lord.
É  o A pequena princesa.

Para quem acha que com um título desses, fala de contos de fadas, digo que fala, sim, mas também fala de superação, de força de vontade, de ternura, firmeza, caráter.

Minha avó Maria, que encorajava meu hábito de ler, do jeito dela, me deu um exemplar usado, aliás, me deu o dinheiro para comprar um exemplar usado de A Pequena Princesa. Acho que foi o primeiro livro que comprei... apesar de haver ganhado o dinheiro, a escolha foi minha. Tenho até hoje o livrinho, está aqui do meu lado enquanto escrevo, e sinto que é uma parte de minha vovó junto de mim.
Algumas das falas da personagem Sara Crewe são válidas para qualquer pessoa. Gosto de uma cena dela com a criada, a Becky, no qual a Sara diz: “Sabe, nós somos duas meninas iguais. Sou uma menina como você. É um mero acidente que você não seja eu e eu não seja você”
Creio que o livro foi bem avançado para a época. Existem também versões cinematográficas, mas não me marcaram.

Da mesma autora, tem o livro O Jardim Secreto.

É um primor. A tradução da Ana Maria Machado é linda, e mantém o charme do original. Foi um dos meus preferidos, e a evolução de Mary, de mimada, rancorosa e preconceituosa, intolerante, em uma pessoa que aprende a respeitar os outros, que aprende a conviver com as pessoas, junto ao também mimado e insuportável Colin, com o irmão da copeira Marta, o incrível Dickon, um verdadeiro precursor da defesa da natureza, é linda de se acompanhar. Outra vez, não gosto do filme, apesar da fotografia linda.
 Minha tia Marilene era pedagoga, supervisora na escola onde eu estudava, e tinha muitos livros em casa. Como eu vivia com minha avó, na mesma casa onde minha tia vivia, tinha contato com todos esses livros, revistas, jornais.
Meus pais moravam na casa ao lado, mas em outro lote, e eu até passava o dia com meus irmãos, mas na hora de dormir, não admitia não voltar para a casa de vovó. Sinto falta dela todos os dias.
Entre os vários livros que conheci e que eram de minha tia, guardei para mim um muito especial? Marina Marina, do Carlos Heitor Cony.

Passado na década de 70, não falava de ditadura, política ou ativismo, mas falava de uma menina que era diferente, e sofreu para se adaptar, sem perder a essência de quem era. Marina foi criada pelo pai, em uma praia no litoral sul, e aos 15 anos é mandada para o Rio para estudar. Vai viver com uma família de classe média alta, totalmente fútil, apesar do bom coração, e quase desiste ao perceber que não era aceita, porque não falava gírias, não gostava de Rolling Stones e não se vestia do jeito da moçada descolada, alem de, absurdo dos absurdos, ser uma leitora compulsiva e falar cinco linguas! 

(durante as pesquisas para achar uma imagem do livro, já que minha câmera está com defeito, descobri que o livro foi adaptado e virou novela da seis na Globo, em 1980! Uia! Com o Lauro Corona fazendo o par da Marina. Pelo que li da sinopse, não tem muito a ver com o romance... só é inspirado.)



As Meninas! Não o da Lygia Fagundes Telles, que também é bom, mas o Little Women, Mulherzinhas, da Louisa May Alcott. 

Cara, eu adoro a Jo! Na verdade, assim como naquele filme lindo do Spike Jonze, Onde vivem os monstros, acho que cada uma das personagens pode representar uma faceta da personalidade de cada uma de nós. A independente Jo, a meiga Beth, a certinha Meg e a ambiciosa Amy...E a Sra. March, que mulher incrível! 
Esse livro, se você pesquisar, vai ver que foi marcante para muita gente, olha só aqui


Encerrando, um dos principais livros da minha adolescência:  Revolução em mim, da Márcia Kupstas.

Li na oitava série, e fiz o professor indicar para a turma (porque eu era CDF até o talo nessa fase da minha vida, e todos os livros que ele pensava em indicar, eu já havia lido, então, ele achau mais fácil me pedir para indicar algum que eu havia gostado).
Conta a história de Maria Rita, filha mais velha e única menina de um casal de classe média alta, em São Paulo, no ano de 1984.
Maria Rita tinha a vida perfeita para uma adolescente de 15 anos, e começava o ensino médio (antigo 2ºgrau) em um colégio novo, ansiosa por viver novas experiências – de paqueras e viagens, porque esse era o mundinho dela.
No começo do ano, tudo desmorona: seu pai arranja uma amante, a mãe descobre, e se separa. Rita vai morar com a avó materna, D. Dinorah, na Lapa. Para quem fora criada em bairro nobre, era o fim.
Só que o aprendizado entre a jovem mimada e alienada e a avó, é lindo.
Rita descobre o amor, e junto, a vida: política, preconceito, ativismo, o outro lado do mundo cor de rosa em que fora criada.
O pano de fundo é a campanha pelas Diretas Já!, e o personagem do seu Mário, namorado da avó de Rita, é um contraponto que faz com que a menininha perceba que havia algo de errado com o mundo, e que vale a pena lutar para mudar.

De todos, é o mais feminista, na minha opinião. Veja aqui uma entrevista com a autora. 


Porque escolhi esses livros?
Talvez seja coincidência que sejam os meus preferidos, mas, vamos aos pontos em comum, entre obras tão diferentes, escritas em épocas e locais distintos.
Primeiro, o fato de que as personagens principais são femininas. Sara, Mary, Marina, Jo e Maria Rita.
E cada uma delas buscava as coisas por si.
Gostavam de ler – bem, a Maria Rita não, no começo, mas depois aprende!
Mesmo as crianças Sara e Mary tem traços marcantes, com as quais a gente se identifica.
Coincidentemente, dos cinco, quatro foram escritos por mulheres.
E eles foram o pano de fundo da minha formação, junto com Lobato, com Sidney Sheldon, com Angélica, a marquesa dos Anjos, com As Brumas de Avalon, com Machado de Assis e literatura de banca (Julia, Sabrina, Bianca e os meus queridos romances históricos, que hoje estão meio de lado, mas dos quais não me envergonho, não mais!)

Então, quero compartilhar esses livros, porque creio que podem ser bons presentes, para crianças e adolescentes, e até adultos: se você não leu Mulherzinhas, não sabe o que está perdendo!
Leia, dê de presente para sua filha, sobrinha, afilhada, aluna. São lindos.
E quem sabe a gente consiga que os meninos também leiam, e percebam que os rótulos não servem para outra coisa senão limitar nossas possibilidades de conhecer o diferente?

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

"Esse povo" dos Direitos Humanos...

O senador Romeu Tuma morreu no dia 26 de outubro de 2010.
Era delegado de Polícia.
Foi chefe do DOPS, na década de 70. Trabalhou com o famigerado Sérgio Paranhos Fleury.
Tuma, Fleury e Perrone


Um dos TT Brasil no dia da morte foi: DOPS.
Eu, curiosa para saber o que falavam... já sei, já sei... quebrei a cara!
Havia tuites lembrando o que era o DOPS, polícia política, porão de ditadura (foi criado pelo Getúlio, no Estado Novo, não esqueçamos que o Velhinho foi ditador golpista, sim!) e as torturas e mortes.
E havia os podres.
Um me chamou a atenção, foi um dos primeiros que apareceu, o sujeito devia ter acabado de postar:

Esse "sujeito" foi policial do DOPS. Criou um esquadrão de extermínio, e morreu em circunstâncias suspeitas.

"Bons tempos eram os do DOPS, quando a polícia podia trabalhar sem esse povo dos direitos humanos para atrapalhar"
Detalhe: o sujeito deve ter no máximo uns vinte sete, vinte e oito anos, pouco mais novo que eu, e, logicamente, não viveu nada de ditadura...

Ouço isso diariamente.
De policiais antigos e novos, de vítimas, de políticos, de amigos, vizinhos, da manicure ao empresário, do pedreiro à servidora pública federal...

E, vou te falar, isso me cansa...
É exaustivo ter que ficar dizendo que não é nada disso.

Eu apelei: tuitei (sem mencionar, não vou dar moral para otário reacionário!) que se ele tinha saudade da ditadura, das torturas, dos métodos de "trabalho" que apuravam tudo, que passasse na minha delegacia, que eu daria um jeito dos tiras antigos matarem a saudade dos bons tempos... mas queria ver ele matar a saudade do que nunca viveu (ainda bem!) na própria carne.
Choque, porrada, sangue e lágrimas.

Vítima dos "métodos coercitivos de interrogatório"

Método coercitivo de interrogatório?
Uma vez li um artigo de um promotor, propondo um "debate jurídico" sobre a admissibilidade de tais "métodos coercitivos".
Porão do DOPS


Quero ver ele conviver consigo mesmo depois...
Se eu teria coragem de torturar alguém? Não sei, espero que não.
Mas enquanto profissional, servidora pública responsável pela aplicação da lei, mesmo que eu tivesse coragem, não, coragem é virtude do coração, não é coragem torturar ninguém... mesmo que eu tivesse disposição para usar de tais métodos, a lei me impede, me proíbe e me reprime.

O que muita gente não entende é que tortura não soluciona crime.
E que a criminalidade comum não é uma violação no sentido primário de direitos humanos.
Como assim???

A expressão direitos humanos surge para proteger os cidadãos dos abusos do Estado.
Falamos em gerações de direitos humanos, mas eles tem em comum o objetivo de garantir a liberdade face ao Estado, a igualdade, face ao Estado e promovida pelo Estado, e a solidariedade, fomentada pelo Estado.

Quando o cidadão infrator comete o delito, ele não viola os direitos humanos, ele comete um delito, e vai responder pelo crime que cometeu (ou deveria, não é?).

Quando um policial, no exercício da função, comete um ato de tortura, ele comete um delito, um crime, e responderá, ele, policial, pelo ato que praticou, mas este ato criminoso representa uma violação aos direitos humanos, aos direitos de todos os cidadãos, porque o policial é um servidor público, um agente de aplicação da lei, e não pode ser o violador desta lei.

Policiais da PMESP, na manifestação que terminou em confronto

Somente a tortura representa violação aos direitos humanos? Não.
Somente a polícia comete violações aos direitos humanos? Não! Infelizmente, não!
O Estado comete violações, ao negar direitos básicos, ao não efetivar os direitos mais fundamentais.

O policial é vítima de violações de direitos humanos, quando cumpre uma jornada abusiva, sem remuneração extra, sem equipamentos de segurança adequados, etc.
Se uma empresa viola normas de segurança do trabalho, é multada. Quando o Estado viola as mesmas regras, o servidor tem poucas opções.

Mas estou tergiversando.
O que me incomoda muito é essa dicotomia inexistente mas concreta, mais real que a realidade: polícia vs. Direitos Humanos.

A polícia deveria ser o bastião da promoção dos direitos humanos.

Quem é que está na rua 24x7? Quem entra em lugares onde nem a ambulância do SAMU vai?
A viatura...
Policiais visitam o bebê que ajudaram a vir ao mundo

Mas não sou ingênua.
Existem milhares de bons policiais no Brasil e no mundo todo.
Mas são ainda as maçãs podres que se sobressaem e impregnam a representação da polícia, dos policiais.

Então, para o falecido, eu só vou deixar essa charge, bem adequada, para eles e outros da mesma estirpe: 

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Sobre Glee, BBB e Machuca...

Neste domingo eu resolvi assistir a primeira temporada de Glee, completa. 
Já havia visto alguns episódios, e tal, mas não acompahnava.
Estou gostando, se bem que as vezes a Rachel me dá vergonha alheia, o prof. Shue seja um panaca completo (vá ser lerdo assim lá... longe de mim!) e a Sue Sylvester seja insuportável.
Tá bom, sei que é bem caricato, é tudo exagerado, ironia mode on quase o tempo todo.
Mas o que me chateia é que as pessoas entendem as coisas como querem (eu também, claro).
Passamos tudo que lemos, ouvimos ou assistimos por um filtro formado por nossas percepções, e essas percepções, apesar de serem compostas por esses elementos externos, podem ser refratárias a esses mesmos elementos se eles vem em uma embalagem diferente. Se o conteúdo for diferente então, acho que fica pior.


Não sei se vou conseguir colocar o que estou pensando de forma inteligível, mas vou tentar.





Assistir Glee, ver os jovens do grupo sofrerem humilhações diárias, só por serem diferentes, por estarem em uma "camada mais baixa da cadeia alimentar estudantil", para mim, soa como um alerta de quanto podemos ser patéticos. A série deixa claro isso para mim, mas me preocupa, porque acho que muito do seu sucesso não vem do conteúdo irônico e iconoclásta, e sim, de gente que se diverte vendo as humilhações dos diferentes.
É a história de se sentir "menos mal" por saber que existe gente em situação pior.


Posso estar enganada, quero estar. Afinal, das pessoas com quem converso, na net ou fora dela, que assistem Glee, a maioria comemora o fato de haver um elenco diversificado, com representações de diversos, hum... segmentos? (detesto essa palavra, mas creio que cabe aqui). 


Então, pode ser só paranóia minha.


É que me lembro de uma cena de "Machuca". 


 Na reunião de pais, para discutir a inclusão dos jovens pobres na escola (religiosa) frequentada pelos filhos dos mais ricos, como Gonzalo, a mãe de Pedro (o Machuca, do título) profere o seguinte discurso: 


– Quando eu era criança, vivia numa fazenda perto de San Nicolas. Meu pai tomava conta do gado, se alguma coisa acontecesse para algum animal era retirado da nossa comida no final do mês. Não importava o motivo, meu pai era sempre o culpado. Eu vim aqui para Santiago quando tinha quinze anos porque não queria que as minhas crianças fossem sempre culpadas por tudo. Mas parece que aqui as coisas são iguais, os culpados sempre somos nós. E, é assim que as coisas devem ser. Ninguém irá nos culpar por não mudar a história. As vezes eu me pergunto, quando irá fazer as coisas de outra maneira? Quando iremos nos atrever a fazer as coisas diferentes? Esta é minha opinião.


Dentro do contexto do filme, eu achei, sinceramente, que nenhum daqueles pais ricos que estavam ali teriam coragem de continuar exigindo a saída dos alunos pobres.

Mas uma mãe se levanta, e parece que ela nem ouviu o que a mãe de Pedro Machuca disse, e continua, insensivelmente, a exigir a expulsão dos bolsistas.


Li também um guest post, entitulado "Como fazer com que eles escutem?", publicado no blog da @LolaEscreva.


E é assim que me sinto. Estou a chata, a irritante, a politicamente correta, a estraga prazeres.
E se eu me seguro e não aponto porque eu acho que o vídeo que você recebeu e está achando o máximo (com cara está imitando ex-presidente Lula, usamdp cliches do gênero analfabeto e não fala inglês) é idiota, e que só aponta preconceito de classe, de origem, entre outros, eu me sinto mal, sabe? Engasgada, com todas as dores do mundo.


Mas se eu falo, não consigo me manter à parte. Todo preconceito me dói. Eu fico pessoalmente ofendida ao ler os comentários anônimos na internet, sobre qualquer assunto que seja relacionado a algum tema mais ou menos polêmico, como aborto, sexualidade (seja estudo sobre, seja notícia sobre estupro, é nojento o que algumas pessas escrevem!)

Tenho tido dificuldades em lidar com as pessoas, especialmente as mais próximas, com quem eu convivo, quando emitem opiniões preconceituosas. Só que não consigo ser didática e me manter à parte, acabo me empolgando, me envolvendo e me enfurecendo.

Como outro dia, no almoço de família, conversando sobre o BBB. O pessoal chamando a Paula de "baleia", a Ariadna de "ele" e quando eu tentei argumentar que aquilo era preconceito, disfarçado de "piadas inocentes", minha irmã disse que eu me identifiquei com a Paulinha (porque também sou gorda, claro,né?) e por isso estava "tomando as dores".Pronto. Desisti de conversar. E são meus parentes, pessoas da minha família, todo mundo com curso superior, pós, etc. (Falo isso porque no meu imaginário ainda existe o conceito de universidade enquanto academia, que forma e amplia horizontes, mas sei que estou errada, pois já estive na faculdade e na pós-graduação, e sei que os velhos "ismos" não acabam com a aprovação no vestibular, e muito menos com a colação de grau)

A minha percepção de Glee é uma, a de outras pessoas pode ser totalmente oposta. 

Claro, é só uma série de tv, não vai mudar nada, só repete os clichês alterando a forma, incluindo alguns dos tradicionalmente excluídos, etc, etc.

Mas veja, eu procurava notícias sobre a série, e vi que o Slash negou que os produtores da série usassem músicas dele (da época do Guns, óbvio, né...) para fazer versões em um episódio, tipo fizeram com a Madonna.


 E nos comentários (anônimos, claro, como sempre...) vem os idiotas e falam coisas como Slash ser o maior artista de todos os tempos (oi?! Nem entre os dez maiores guitarristas ele está, né, gente. Menos, please! Já tive minha fase Gn'R, tudo bem, mas calma lá!), e o pior, dizendo que ele está certo, porque rock é musica de "macho" e Glee é seriado de "baitola".

Cada dia me dá menos vontade de sair de casa, conhecer gente nova, conversar até com os velhos amigos. 
No twitter a gente tem opção de dar unfollow e block, aqui eu posso moderar se aparecer um imbecil nos comentários, mas na vida real, a gente tem que lidar.
E o mundo está cheio de Sues, de jogadores de hoquey, de chearleaders, de repórteres de escola, cada um destilando seu veneno e seu preconceito.

Cena do filme American History X - fala bem do ódio e do preconceito

Vou continuar a assistir, para ver como se desenrola, mas sério, se alguém não der um jeito na Sue e naqueles brutamontes do hoquei e do futebol americando, vai ser difícil. Estou começando a achar até compreensível quando alguma das vítimas de agressões constantes resolve revidar e comete um massacre.
E não é para ser assim!


Aqui, alguém me fala, melhora??

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Twister, a imagem de um pesadelo

No último domingão, estava sentada na frente da tv, com uma caneca de café, esperando acabar de acordar, com o controle da tv na mão, zapeando, topei com o filme "Twister" passando em algum canal.




E até hoje, quinze anos depois, a mera menção a esse filme me traz uma recordação péssima.


Eu tinha 19 anos, fazia cursinho, e era cinéfila, sonhava em fazer jornalismo para só trabalhar fazendo o que mais amava (ingenuidade...). Então, uma vez por semana, em geral, eu ia ao cinema, sozinha, na parte da tarde, que era mais vazia, antes de ir para a aula.

Já existia o Shopping Cidade, no centro de BH, mas nem sempre passava os filmes de que eu gostava, e além do mais, eu apreciava o clima de cinemão, tipo o Jacques, o Palladium, o Art Palacio, cinemas de rua. Me lembravam minha infância, assistir os filmes dos Trapalhões e depois lanchar na Torre Eiffel, ou na lanchonete da Lojas Americanas (ainda não existia rede de fast food no centro, só tinha o Bob's, lá na praça da Liberdade).



E aí, escrevendo o texto, percebo que já estou justificando porque eu gostava de ir aos cinemas do centro, em vez de ir ao do shopping... como se fosse preciso me explicar pelo ocorrido comigo, como se fosse culpa minha...

Bem, cut to the point: estava eu, de calça jeans, camiseta, tênis, mochila nas costas , livro na mão.
Comprei meu ingresso, entrei no cinema, não lembro se no Jacques ou no Palladium, mas foi em um deles.
Entrei, a sala enorme, vazia, dia de semana, à tarde. Começam os traillers, chegam os retardatários. Apagam-se totalmente as luzes, e começa o filme. Eu, concentrada, nem prestei atenção quando, na sala semi-vazia, senta-se uma pessoa na mesma fileira que eu.

O filme, para quem não sabe, é um desses disaster movie,  que conta a história de caçadores de ciclones, no meio-oeste norte americano. É extremamente barulhento, agitado. Lá pela metade, ocorre uma pausa, depois que um dos twisters do título passa por uma cidade e morrem algumas pessoas.

Foi nesse momento, em que o som diminuiu, que eu ouvi os gemidos vindos do lado. A pessoa, que sentara na mesma fileira que eu, havia se aproximado de mim, e estava a duas cadeiras de distância.
Gemendo. Se masturbando. Com o pênis pra fora, sem nenhum pudor.

O que eu fiz?

Levantei, mudei de lugar.

Ele?

Foi atrás! Sentou-se na fileira de trás!

Eu me levantei, catei minhas coisas, e sai da sala de cinema, puta de raiva.  Cheguei na bilheteria, e falei com a moça do caixa. E ela? Nada, nem aí. Eu, chorando, saí de lá, com ódio! De quem? De mim, por ser tão burra!

Quando saí do cinema, já na rua, com as lágrimas escorrendo, um homem de meia idade se aproximou e perguntou porque eu chorava. Eu fiquei com vergonha de dizer. E ele continuou, dizendo que eu era muito gostosa, e que sabia um jeito de me consolar!



Saí correndo, e ele riu.

Quando estava no ponto de ônibus, olhava com receio para todo homem que se aproximava. Quando sentei, o coletivo vazio, coloquei a mochila no assento vago, temendo que algum homem se sentasse.

E repassei o ocorrido, com mais calma.

Fiquei imaginando outros desfechos para a cena do cinema, com o masturbador anônimo.
Imaginei que eu levantava, pegava a mochila, pesada de livros, e tacava com toda a força na cabeça do cara, para ele desmaiar com o pau pra fora, e ser preso por ato obsceno.

Imaginei que em vez de não fazer nada, a funcionária do cinema chamava a segurança, e eles iriam tirar o cara da sala, passar-lhe um sabão, e expulsá-lo para sempre de lá.
 

O pior foi quando eu contei em casa. Minha mãe disse: "tá vendo no que dá, uma moça ir ao cinema sozinha?"

Essa história é só uma entre várias. Acho que todas as mulheres já passaram por algo assim.

E diante do pior que pode acontecer, a gente releva esses "incidentes", nem comenta. Enterra lá no fundo da alma, e segue em frente.

Mas até hoje, quando vejo ou leio sobre o filme,  me vem aquele gosto azedo na boca. Aquela vontade de vomitar toda a raiva em cima daquele sujeito, que não me lembro se era velho ou jovem, branco ou negro, careca ou cabeludo, gordo ou magro. Só me lembro que era homem. E que até hoje, me sobe uma ânsia quando estou sozinha e um homem desconhecido senta-se ao meu lado...


Atualmente, quando reflito sobre o fato, consigo perceber que não havia naquele sujeito a intenção de seduzir, ou impressionar. Ele não esperava que eu "caísse de boca", como em um filme pornô, ou que participasse de qualquer forma. Ele só desejava a minha passividade, e pior é que ele sabia que o máximo que eu ou qualquer mulher faria seria sair. Fugir. Porque para ele, e tantos e tantos outros, em maior ou menot grau de perversão, não somos pessoas. Somos vítimas, as ovelhas. E somos também as culpadas, afinal, quem mandou a gente estar sozinha no cinema, no ônibus, no bar, em qualquer lugar?



Tantas outras já escreveram sobre isso, inclusive, o post de ontem da Lola, que falou sobre as grosserias que as mulheres escutamos, as vezes antes mesmo de termos formas de mulher, e a Georgia, que falou sobre a angústia de sair sozinha.
   

Só quis compartilhar, e dizer que se isso acontecer com você, não é sua culpa. E você não tem que se envergonhar. Temos é que nos unir e fazer a sociedade perceber que quem tem que ter vergonha é o exibicionista, não a vítima. 
(eu tive que dizer isso prá mim mesma muitas e muitas vezes, e somente agora, depois de ler tantas e tantas blogueiras incríveis, reconheci essa verdade básica)